segunda-feira, 11 de março de 2013

DOWN, SOMOS SÓ PARTE DA IMENSA DIVERSIDADE DOS SERES HUMANOS


"Eu me sinto igual a todo mundo. Nós downs perante a sociedade somos downs, mas, perante Deus, somos normais. É claro que eu sei que temos uma cópia a mais do cromossomo 21. Mas todo dia nasce um bebê down ou um bebê torto, ou loiro, ou moreno, ou mais inteligente, ou menos. Nós somos apenas parte da imensa diversidade dos seres humanos. Por isso, somos normais."

Protagonista do filme "Colegas", do diretor Marcelo Galvão, o ator Ariel Goldenberg, 32, se define como um "guerreiro". E ele é. Guerreiro down, diga-se. Down de síndrome de Down mesmo.

Abaixo, a entrevista de Goldenberg, em que ele revela o segredo de seu sucesso e dá dicas sobre como os pais de crianças com Down podem ajudar seus filhos.

A campanha "VemSeanPenn" já foi vista por 1,4 milhão de pessoas. Afinal, ele vem?
Agora, é com ele. Mas, mesmo que ele não venha, eu queria deixar claro que eu já devo muito ao Sean Penn pela forma digna com que representou a condição dos deficientes mentais em "Uma Lição de Amor", de 2001. No filme, ele interpretou um pai com deficiência mental que luta pelo direito de criar sua filha. Acho que o Sean Penn nesse filme fez o que nós tentamos fazer com o "Colegas". Mostrou para a sociedade que os downs são capazes de fazer qualquer coisa.

O que você fazia antes de se tornar ator?
Eu trabalhava no marketing de uma empresa gigante de tintas. Aproveitei para fazer uma captação de recursos para o filme "Colegas", quando ele ainda era só um projeto. Falei com meu chefe que eu seria o protagonista, que o argumento era muito bom. Eles deram R$ 500 mil [a produção toda ficou em R$ 5,5 milhões].

Você não teve medo de tomar um não na cara?
Eu sou um cara que luta, um guerreiro. Eu luto muito para conseguir o que quero. Sou persistente. Meu sonho é ser ator e cineasta. Toda a minha vida está voltada para esse foco de atuar e dirigir.

Como foi a sua infância?
Foi uma infância feliz e relativamente comum. Meus pais são separados desde não sei quando; fui criado com três irmãos. Minha mãe me colocou em uma escola normal, que foi a minha primeira escola. Depois, fui estudar em uma escola especializada em alunos com síndrome de down. Recomendo, às famílias que possam, que coloquem seus filhos com down em uma escola especializada, que sabe melhor como lidar com nossas características e necessidades.

Qual é o papel da sua mãe na sua vida?
Minha mãe me deu muita segurança.

Segurança do amor dela?
Olha, a questão mais importante aqui não é o amor. A questão mais importante é o apoio. É diferente. Amor eu tenho da minha esposa, a Rita. É claro que existe o amor de mãe, mas, agora, com o amor da minha esposa, eu não preciso mais do amor da minha mãe. O que eu preciso é do apoio dela. E isso eu tive, tenho e terei sempre. Por exemplo: agora mesmo, eu pedi a ela que me conseguisse algum contato no SBT, para que eu possa investir na minha carreira de ator. Eu quero entrar no casting de novelas do SBT, da Globo ou da Record. E ela conseguiu.

Como você avalia o seu desempenho no filme?
Eu dei a minha alma para que o Stallone expressasse a realidade de um down que luta para materializar os seus sonhos. Stallone sou eu. Tenho orgulho de dizer que fizemos o filme todo em um take só. Gravamos direto, não houve a necessidade de refazer cenas porque os atores se esqueceram do texto, ou porque não colocaram verdade nos personagens.

Você alguma vez se sentiu discriminado por ser down?
Uma vez. E foi, por coincidência, em um cinema. Eu e a Rita estamos acostumados a ir ao cinema toda sexta-feira. Sempre fomos tratados com respeito, mas, naquele dia, o gerente se recusou a aceitar que pagássemos meia-entrada, que é um direito assegurado aos downs. Ficou claro que ele não nos queria lá. Me subiu o sangue na hora.

Como você conheceu a Rita?
Entrei no site "Grandes Encontros", que é uma sala de bate-papo para pessoas com deficiência, e a encontrei. O que ela tem de mais? Nada. Apenas uma alma pura e os olhos azuis bonitos. Casamos nos rituais judaico, religião da minha família, e no católico, da família da Rita.

Você se sente um cara diferente das pessoas comuns?
Não. Eu me sinto igual a todo mundo. Nós downs perante a sociedade somos downs, mas, perante Deus, somos normais. É claro que eu sei que temos uma cópia a mais do cromossomo 21. Mas todo dia nasce um bebê down ou um bebê torto, ou loiro, ou moreno, ou mais inteligente, ou menos. Nós somos apenas parte da imensa diversidade dos seres humanos. Por isso, somos normais.

Muitas pessoas têm filhos com síndrome de down e não sabem lidar com essa situação. Que conselho você daria?
Tem que ter paciência com o filho. E se o filho fizer alguma coisa errada, tem que ser firme ao apontar o erro. Firmeza no bom sentido, falando de modo que ele entenda. Outra coisa importante é apoiar o filho. Se ele quiser arrumar uma namorada, ou se casar, tem de respeitar esse sentimento.

E um conselho para quem tem Down?
Eu digo que tem de lutar. Tem de lutar muito. Uma das minhas frases preferidas é "do luto nasce a luta".

Quais são os próximos passos?
Quero virar ator profissional, viver disso, estudar para me tornar diretor como o Marcelo [Galvão, diretor de "Colegas"].

E ter filhos, você e a Rita não planejam?
Não. Porque dá muito trabalho formar um filho com a síndrome. E há uma probabilidade muito grande de termos um filho com a síndrome. Eu não quero me arriscar.



FONTE: FOLHA DE SÃO PAULO


O TEXTO ENCONTRA-SE EM SEU FORMATO ORIGINAL. ERROS GRAMATICAIS E DISTORÇÕES SÃO DE RESPONSABILIDADE DO AUTOR.

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